sexta-feira, 24 de setembro de 2010

COMO CRIAR UM "DEUS"

A busca de um deus leva o homem a criar ícones, a admirar outros homens como se fossem as suas manifestações. Homens inteligentes e com plenos conhecimentos se identificam como representantes de deus e formalizam atitudes, montam teatros para personificar a imagem de Deus e eles travestidos das mais altas pompas se dignam a mostrar suas beatitudes e a tecerem palavras como se divinos fossem.
Para Platão apud Durant (1942, p. 47),
acredita que sem a crença em Deus nenhuma nação pode ser forte. Uma simples força cósmica, ou primeira causa, ou élan vital, qualquer coisa não dotado de personalidade, não poderia incutir esperança, nem inspirar devoção e sacrifício; seria inapta a confortar os corações sofredores e alentar as almas cheias de tribulações. Mas um Deus vivo pode fazê-lo e ainda servir de freio para os egoístas moderarem sua cobiça e dominarem as próprias paixões.

A sociedade se submete as estas exigências fundada nas suas necessidades, pobrezas e carências. As desigualdades permitem a subordinação, e a educação se atrela a estes modelos, colaborando com medos, e criando moralidades e éticas.
Conforme Durant (1942, p. 47), “Ótimo que a esta crença em Deus se acrescente à crença na imortalidade individual: a esperança de outra vida nos dá coragem de suportar a idéia da nossa morte e da dos seres a quem amamos; e estaremos duplamente armados se combatermos com fé”.
Estas resultantes de fé e imortalidade nos fazem lutar e sobreviver as imposições geradas pelos próprios conflitos não resolvidos fortalecidos pelas covardias humanas e o não querer ver a sua própria realidade de mortal.

Todas as áreas de conhecimentos vêm dos sentidos, havendo a morte, portanto, não haverá mais sentidos. Como o homem pretenderá ainda ter idéias após a morte (Voltaire 1984, p. 74)?

A imaginação humana vai muito longe, imaginemos hoje estarmos no meio de florestas, matas fechadas e com a total ausência da vida urbana. Sem as comodidades que nos rodeiam como internet, tv(s), som, telefones, etc., para nos alimentarmos teríamos que recorrer as benesses fornecidas pela natureza. Caçar, produzir vegetal para nossas necessidades básicas. Além disto, em condições inóspitas aonde qualquer movimentação de cachoeiras, rios e ventos nos conduzissem a condições de medos. Para suprir a estes medos, para buscarmos o sustento e para termos nossas produções alimentares que poderiam a qualquer momento ser destruídas por intempéries, só nos restariam a crença em deuses oriundos destes mundos. Teríamos que nos agarrar a qualquer coisa, e necessariamente formaríamos idéias de que a própria natureza teria que nos resguardar. Os nossos pensamentos seriam vinculados ao mágico.
Em determinado momento caminhando sobre áreas onde encontraríamos ossadas de animais que nunca vimos e sem termos respostas começaríamos a fazer deduções e inventarmos situações que preenchendo o mínimo de nossos conhecimentos estariam ligados ao mundo que conhecemos. Se o animal é grande e possui chifres, com corpos diferentes do que sabemos e possui rabos, porque não dizermos que eram dragões, e a partir daí com nossas deduções, perguntaríamos que o matou. Será que há homens capazes de ter esta força. Iniciamos a definir entidades capazes de nos substituir e ter força suficiente para nos ajudar a eliminar estas coisas do mal. Hoje felizmente sabemos que ossadas de dinossauros são ainda encontradas e que estes animais viveram a milhões de anos e que nunca conjuntamente com o homem, o homem é uma criatura contemporânea ao dinossauro. Sem respostas juntamos os demônios e deuses, algumas como coisas que nos põem medos e outros criamos para nos salvar destes medos. As lendas sobre homens fortes que combatendo dragões conseguiram eliminar estes males que afrontavam ao homem desprotegido. Lendas que faziam parte do cotidiano e se transformavam em coisas que poderiam destruir o homem. Para solucionar os problemas se construíam todas as espécies de rituais e imagens que pudessem ajudar ao homem a se defender.
Nunca, em momento algum, houve contatos com deuses ou Deus, a não ser influenciado pela imaginação humana. Fatos condizem a avaliar que se houvesse existido tais contatos, com certeza Deus não favoreceria determinadas sociedades, mas sim aqueles que em seu nome utilizam a força política e dos mitos para se beneficiarem e manterem seus privilégios. Os mitos criados através dos abstratos e transformados como coisas existentes pelos homens, se estabeleceram de acordo com as vontades daqueles que exercem sobre a sociedade, o poder. A política e religião se tornaram indispensáveis para estas garantias de manipulação.
Para Morris (2004, p.189), em sentido comportamental, as atividades religiosas consistem na reunião de grandes grupos de pessoas que executam longas e repetidas exibições de submissão, no intuito de apaziguar o individuo dominante;

esse indivíduo dominador assume muitas formas nos diferentes tipos de cultura, mas conserva sempre um fator comum: um poder imenso. Às vezes, assume a forma de um animal de outra espécie, ou uma versão mais ou menos idealizada. Outras vezes é retratado como um membro sensato e idoso da nossa própria espécie. Pode ainda tomar um caráter mais abstrato e receber o nome de “o estado”, ou outros equivalentes. As respostas submissas que se lhe oferecem podem consistir em fechar os olhos, abaixar a cabeça, por as mãos em atitudes de súplica, ajoelhar, beijar o solo, ou mesmo chegar à prostração extrema, freqüentemente acompanhada de vocalizações de lamento ou de cânticos. Se esses atos de submissão são bem sucedidos, o individuo dominante acalma-se. Como mantém enormes poderes, as cerimônias de apaziguamento têm de ser praticadas a intervalos regulares e freqüentes, para impedir que o dominador volte a sentir-se irado. Em regra, mas não sempre, o indivíduo dominante é chamado um “deus”.

A necessidade de o Estado criar um sistema opressor ligava-se diretamente ao envolver o cidadão no processo da subordinação, oferecendo a ele a libertação dos jugos, a possibilidade de sobressair daquela situação de dificuldades e nesse momento, o medo estabelecido por forças divinas era a melhor proposta. Assim, o homem precisa de manifestações que se identifiquem com os seus problemas, sejam da ordem que forem.
As relações religiosas possuem padrões que se diferenciam pelas formas utilizadas no processo de dominação, podem ser colocadas à disposição da fé fazendo com que o crente materialize determinadas sensações difundidas como espirituais, ou podem se manifestar através de possessões. O fiel que possui mais conhecimento sobre suas realidades, trabalhos, educação se limita a deter determinada religião como conseqüência da sociedade em que vivem, estruturação da família, a ética, posturas convenientes ao seu meio. Já para o menos erudito, o analfabeto aquele que não detém o poder do conhecimento científico. Para ele as relações de sentir-se possuído são maiores, com isso a dança, os gritos, os sons de instrumentos, garantem a personalização de invocação e ligação com deuses ou espíritos daqueles que morreram em condições boas ou más, determinando o nível de condutas da evolução espiritual. Sendo estas evoluções de acordo com os consentimentos dados pelos deuses ou Deus.
Determinadas pessoas por estarem passando por momentos difíceis, como a falta de recursos financeiros, problemas de doenças incuráveis ou problemas psicológicos sem soluções imediatas se ligam a movimentos revivalistas.
William Sargant (2003), enfatiza que inúmeras pessoas podiam ser persuadidas por “revivalistas” a acreditarem que teriam a salvação, se defendessem interesses divinos.
O fortalecimento de determinadas crenças foi estabelecido em tempos remotos, quando as orgias das danças tribais faziam com que os homens, em seus entendimentos, estivessem vinculados com deuses, práticas comuns nos dias atuais.
Sob estes efeitos o Estado se apropria das crenças populares e atua como manipulador, sendo eles uns das estruturas de dominação, havendo a necessidade da vinculação com mitos, caso contrário, torna-se um estado fraco, já que o povo é dominado com forças abstratas. O concreto, não é motivado pelas políticas adotadas e a visão cientifica é renegada pela maioria. O povo sem opções subjuga-se a conceitos e éticas sociais, ficando a mercê de esclarecimentos que colocam em jogo as ideologias existentes.
As formações do homem no processo evolutivo mostram que da bactéria, do vírus, da metamorfose natural de alguma coisa, há ou haverá um ser desenvolvido (sobre o ponto de vista do desenvolvimento atual do homem) em determinado período. Este desenvolvimento se deu em milhões de anos sobre o desenvolvimento dos animais, dos vegetais e da estruturação do próprio planeta. O homem animal é racional dentro da lógica imposta pela sociedade ou em determinados momentos exerce condições de irracionalidade?
As racionalidades compreendem certas lógicas identificáveis na ampliação do conhecimento. Que pode ser observável nas limitações impostas pelos aparelhos ideológicos do Estado ou da religião. Codificadas através das constituições legalizadas por grupos dominantes que mantém seus interesses e com aprovação da sociedade. Com o estabelecimento de regras, definições de modelos estruturais passando a determinar os novos rumos e supostamente nascem as interações ditas democráticas.
Deuses surgem para fortalecer quem domina de acordo com o Velho Testamento ele é aquele que penaliza se suas ordens não forem cumpridas, e, Moisés tem a incumbência de criar o monoteísmo. De fortalecer a sua imagem junto ao povo, e excluir aqueles que não o seguirem.
Estes excluídos proliferam no mundo atual, são os pobres, e em um mundo globalizado, as diferenças raciais, etnias que divergem dos que tem o poder, religiões são criadas a cada instante, basta haver desavenças entre seus líderes. O mundo se divide entre ocidentais e orientais, cada um por sua vez tentando manter o domínio sobre o outro. E as idéias de buscarem-se as igualdades são vista como paliativas ou concretas não neste mundo, mas principalmente no após morte. Possibilidades de chegarem à riqueza de acordo com seus merecimentos e sofrimentos adquiridos nesta vida, podendo cobrá-las de Deus na vida eterna. As riquezas concentradas nas mãos de uma minoria fortalecem o crescimento de religiões ou instituições de dominação, colocadas à vontade de Deus.
Deus continua a punir aqueles que não acreditam nele e em seus livros que se tornaram sagrados pelos homens para dominar os próprios homens.
As crenças na Bíblia , no Alcorão , nos Dez mandamentos, na Tora, no Budismo, nos mantras, no Xintoísmo e em todos os “ismos” continuam existindo apesar do crescimento tecnológico e da afirmação do conhecimento. O homem continua a criar mitos, mesmo tendo clareza de sua história. O analfabetismo, a falta de investimentos em educação, ou mesmo a necessidade de alguns políticos e religiosos se manterem no poder regional ou mundial mantém em pleno século XXI os mitos.
Determinadas sociedades ficam vulneráveis diante da maioria que são de excluídos. Também homens continuam gerando idéias com a única proposta de manterem Deus, como um alicerce à manutenção de suas prosperidades.
Deus foi criado como uma forma de punição e dominação, gerando o medo entre seus crentes. Uma sociedade justa e sem mitos, sem a dependência religiosa seria impossível existir diante das necessidades que os homens têm da convivência com mitos. Enquanto houver desigualdades e injustiças sociais, deuses serão criados para atenuar as desgraças da sociedade.
Pelas pesquisas mais recentes temos achados arqueológicos provando que o homem já estava estruturado nos moldes físicos dos atuais a sete milhões de anos. O indiscutível é que há adaptações aos diversos meios ambientais, estão no processo de evolução das espécies, de acordo com Darwin (1859) com a Origem das Espécies que enfatiza o processo de seleção natural. Onde estas alterações fisiológicas se dão a partir das transformações e necessidades alimentares, de produção, do ar, das condições climáticas e outros fatores externos ligados também à evolução do planeta.
Aristóteles estruturara o mundo das formas – portanto, o real, se modelando sobre as primeiras relações científicas, dizia ele (apud Durant, 1942, p. 86),

“Que a inteligência progrediu em correlação com a complexidade de estrutura e mobilidade de formas”, “que houve uma crescente especialização de funções e uma contínua centralização de direção fisiológica” e ainda que, “Paulatinamente a vida criou para si um sistema nervoso e um cérebro; e o espírito resolutamente empreendeu dominar o meio ambiente”.

Nada mais claro do que transformações que o homem está fazendo hoje no planeta, a tal ponto que estas alterações infligem moléstias ou alterações genéticas gerando formas modificadas nesta corrente evolutiva, não percebidas por nós hoje, mas identificáveis através dos tempos de acordo com a sistemática evolução. Os descontroles da reprodução humana, para Morris (2004, p.258) a população do planeta no fim do século XVII era 500 milhões em 1967 estava na casa de 3 bilhões, atualmente estamos com 6.500.000 (seis bilhões e meio). Estaremos em breve ultrapassando as possibilidades naturais de suporte da natureza.
Mas voltemos ao ponto das construções e evoluções do homem, tendo na sua base a cultura, principalmente de cunhos religiosos, políticos e com muita determinação, os econômicos, se subordinaram e subordinam todas as relações de produção, de acordo com os tempos. Um exemplo disso foi durante os Impérios da antiguidade que necessitavam de mão-de-obra escrava, influenciando diretamente a reprodução humana.
Também durante o feudalismo e no mesmo período a Expansão Árabe que no primeiro caso, tinha a necessidade de mão-de-obra servil e ao seu lado a igreja mantinha o maior poder de dominação, já que a mentalidade humana estava totalmente subjugada às suas vontades. No segundo caso, tínhamos a expansão como fator de necessidade humana, para poder colocar em prática o Islamismo e as guerras expansionistas.
Os ditados mais freqüentes entre os homens eram, criai-vos e reproduzi-vos, tendo como fonte de inspiração, a Bíblia, criada por homens que precisavam de mão-de-obra para combates, escravos ou servos. O Novo Testamento oferece muitas frases que se preocupam com a reprodução humana em larga escala, já que estes seres poderão trabalhar nos campos em nome do senhor, ceifar a terra em nome do senhor, ir à guerra em nome do senhor, sem estes perceberem que estavam sendo influenciados pelo “Senhor Feudal”.
A cultura manifestada naquele momento, era de reconciliação com Deus e aqueles que não praticavam o cristianismo, de acordo com a vontade da Igreja, eram afetados pela peste. Não conseguiam avaliar que a transmissão se dava pela falta de higiene e sua proliferação estava vinculada aos ratos. Vemos que a falta de educação da população, alicerçada a um analfabetismo e ainda sob o domínio da própria igreja, ficava completamente a mercê desta.
É muito comum que ainda hoje, igrejas, na sua total ignorância, utilizem termos deste tipo, valorizando o senhor feudal, demonstrando aos seus seguidores, que a utilização da palavra “Senhor”, está vinculada aos seus deuses das mais diversas formas.
Na Revolução Industrial a proliferação humana foi ainda mais violenta, gerando quantidades maiores de consumidores e trabalhadores dentro das fábricas. E as estruturas ideológicas tinham que avaliar esta situação, impondo ao homem mais informações que os estruturassem para a procriação, sem necessariamente sentirem por que estavam tendo filhos.
Karl Marx (1818-1883), em sua idéia de superestrutura e da infraestrutura, a exploração da produção e mão-de-obra, acreditava que se acabasse a exploração, acabaria a dominação religiosa, portanto o problema está na infra-estrutura.
Nas regiões do Novo Mundo e Novíssimo Mundo, também não foi diferente, porque na medida em que tinham de produzir monoculturas para as Metrópoles desde a descoberta até a independência estavam sob controles dos capitães hereditários, das nobrezas e dos jesuítas através de suas catequizações que se alojavam em suas terras. Após as independências, com o nascimento de novos poderes entre eles os poderes de determinados grupos subordinados à economia inglesa, onde os próprios latifundiários necessitados de mão-de-obra ou controladores de suas propriedades viam, na procriação, a única forma de manter seus poderes sobre todos e as terras das quais eram proprietários.
Ficam aqui as perguntas: A quem as estruturas eclesiásticas defendem? A quem os governos dominados por outras potências defendem? A quem os dominadores defendem além de suas próprias economias? Ao planeta? Ao homem? Aos seus deuses? Ou nada mais do que seus próprios egoísmos?
Tantos fatores desmedidos, que geram na sua própria existência, transformações genéticas capazes de os levarem, em determinados momentos, a praticar selvagerias, protecionismos e destruição. Tudo nas mais insensatas formas de ideologias, de acordo com suas vontades e na total inexistência de Deus.
A educação na Idade Média, a partir do momento que passa a receber investimentos, esses tem sua origem e controle dentro dos seminários e os poderes eclesiásticos mantêm um rigoroso controle, criando e interpretando livros que se tornarão sagrados.
Segundo Durant (1942, p. 64), “(...) é possível que a longa duração da igreja fosse devida às condições agrícolas da Europa; uma população de lavradores é inclinada á crença o sobrenatural pela sua dependência completa do capricho dos elementos e pela incapacidade de dominar a natureza, incapacidade que sempre arrasta ao medo e, por meio deste, á adoração (...)”.
Faz-se das escolas, uma continuidade das Igrejas e hoje ainda temos várias organizações educacionais submetidas a elas, estando seus profissionais cercados por pressões que os impedem de passar a real educação científica e libertadora.
Nas escolas de Ensino Fundamental e Médio, ainda é obrigatória a disciplina de Ensino Religioso e claro, os professores trabalham explorando o aluno no conhecimento do cristianismo, sem se preocupar em passar o conhecimento da História das Religiões. Também é comum em algumas, as aberturas semanais ou diariamente, as orações e louvações, como se a escola fosse um complemento da igreja, com rituais místicos, esquecendo-se que seu fundamento básico é o mundo científico com uma educação livre e independente. Sabemos que esta independência atrela-se a política, por isso o aluno deve pensar e refletir sobre várias idéias que lhe são passadas. Os profissionais da área não devem submeter os seus julgamentos como verdadeiros e sim estabelecer as possibilidades da crítica. Sempre cuidando as informações, já que representa a política dos dominantes.
Desde o nascimento até a morte, o homem é manipulado, já que as maiorias das informações e opiniões são firmemente implantadas em seu cérebro em tenra idade e não podem livrar-se delas, por meios de simples argumentações. Daí a necessidade de se fundamentar nas novas informações científicas, que o levarão a corrigir seus novos percursos.

ANTICRISTO

ANTICRISTO

Os mundos ocidentais, influenciados por anticristos, não conseguem resistir às forças intelectuais , sobreviver em um mundo repleto de idéias, de religiões que não se envolvem com o cristianismo, onde os cristãos não ultrapassam a um bilhão e trezentos milhões de habitantes (Fonte: Revista Veja 2003).
Todos aqueles que não professam o cristianismo são considerados anticristo.
O mundo, mesmo no século XXI, não consegue ultrapassar a formação ideológica dos mitos. Os mitos superam qualquer equilíbrio da consciência, impedindo todo um processo de liberdade, condicionados a determinismos que se encaixam na construção do cotidiano. Cotidiano esse que vigora dentro das famílias e constrói as relações sociais, dando sustentação a manutenção do que já existe. Inquestionavelmente é difícil mudar toda a constituição de uma sociedade, quando essa, num processo estrutural e conjuntural se alicerçou em cima de dogmas. Para que o sujeito pense diferente, há a necessidade de entrar em contato com novas formas de pensar. A educação deveria ser a norteadora, talvez aí resida exatamente o compromisso que deve haver por parte das escolas, criando não mais indivíduos, mas sim cidadãos que possam através de suas criticas, desenvolverem uma nova ordem social, despreconceituosa, capaz de rever os conceitos existentes e elaborar uma sociedade não tão dependente do Estado e dos sistemas de dominação.
É difícil imaginar que pelo fato de se falar em anticristos a humanidade consiga ligar tal conceito a ateus, a descrentes, aos sem fé, a desalmados, a incrédulos, como se a crença em determinados mitos colocasse os seres humanos em lugares privilegiados.
Como consentir que culturas tão ultrapassadas e geradas nas construções das sociedades se manifestem cinco ou seis mil anos depois, sem nenhuma alteração, mantendo sob as amarras de Estados, que definiam como abençoados aqueles que estivessem com os grandes sacerdotes? Como mostrar que os próprios sacerdotes foram aqueles que denunciaram Jesus ao Estado Romano e se colocaram exatamente contra ele, permitindo a sua morte? Esta igreja, em momento algum, foi questionada como deveria ser, já que naquele período não havia relação nenhuma da identidade cristo como ser espiritual. Somente eliminava-se o questionador. Também se eliminava qualquer possibilidade de concretização da concorrência com o poder judeu constituído e nas mãos do Império Romano.
Religiões passaram todos estes anos dominando e alienando pessoas em nome de Cristo, quando este falava nas igualdades entre os homens. Talvez os homens não percebessem, porque desde criança, estão sujeitas as culturas que aprendem a se ajoelhar, a baixar a cabeça, a se curvarem quando na presença de entidades ou homens que representam as estruturas de dominação.
Não podemos questionar padres, pastores, mestres, sacerdotes, monges, bispos, diáconos, rabinos, papas, quando estes representam os seus deuses junto aos seres humanos. Como questionar aqueles que em troca da fé, cedem comidas, água, amparos morais, possibilidades de unirem seus fiéis junto a Deus?
Como controlar estes mesmos que recebem dos seus fiéis, quantidades enormes de terras, de doações financeiras ou dízimos? Daqueles que viveram em pecados e que na hora da morte querem socializar aquilo que tiraram dos que não tinham.
Incompreensível fazer a sociedade entender o quanto de riquezas estas instituições tiram daqueles que tinham e dos que não tinham. Entender que as riquezas são levadas para os seus países de origem, gerando cada vez mais lucros e permitindo cada vez mais os seus poderes de controle. Funcionam como organizações financeiras ou empresas internacionais que se estabelecem em um país e sugam tudo o que podem.
Envolvem-se na educação, criando escolas e universidades, interferindo na educação de forma a torná-las subordinadas aos seus pensamentos.
Seus representantes religiosos unem-se às políticas, ditando normas, conceitos e alterando as constituições e conseqüentemente adicionam a vontade de Deus nas leis impedindo cada vez mais o desenvolvimento intelectual dos homens.
Como impedir que os tribunais utilizem símbolos ou figuras religiosas nos seus julgamentos ou nas câmaras que criam leis formalizadas pelos homens?
O mito como força e solução, onde pessoas que passam por cirurgias ou são levadas a curas por homens através de seus conhecimentos a se desfazerem dos seus centros paroquianos, das suas capelas, das suas cruzes, das suas imagens e dos seus santos, tendo como sustentação às tecnologias criadas pelos próprios homens.
Como livrar os homens destes medos e destas relações com o sobrenatural? Contendo seus pânicos e suas loucuras.
Se não houvesse por parte da humanidade a criação dos mitos, o homem seria mais consciente de suas realidades? Ou será que a criação de alternativas paliativas é e sempre será necessária para que o homem se sinta mais seguro enquanto estiver vivendo nas suas utopias?
A criação de alternativas, líderes que se tornaram heróis em função da vontade do Estado, mantendo pessoas vulneráveis a estes heróis. Que se tornaram figuras sublimes e de adoração. Marcando a civilização e criando ritos com os passar dos anos. Símbolos que se tornaram verdadeiros e cultuados e lembrados todos os anos, como forma de massificar e interagir com a sociedade. Tratando de vinculá-los ao ambiente psicológico sem dar tempo para questionamentos. Criando histerias coletivas que se mantiveram e se mantém sem a utilização da consciência.

Espírito e Alma

Na antiguidade grega avaliaram-se as relações da interioridade humana. Foram os filósofos, os principais responsáveis pelas construções dos estudos do pensamento, da busca da verdade com novo enfoque, com uma visão mais concreta dos modelos de sociedade. Passou-se a uma sistematização daquilo que se criava através de novos valores, tendo como destaque, a alma e o espírito humano. Aristóteles (384 – 322 a.C) apud Durant (1942, p. 92), afirmava que,

“A alma é todo o princípio vital de qualquer organismo, a soma de seus poderes e processos. “No homem é o poder da razão e o pensamento”. A alma é imortal é “puro pensamento” e que (93), a “criação artística surge do impulso formativo e do anseio de expressão das emoções. A forma da arte é em essência uma imitação da realidade; um espelho em face da natureza ““.

Dividiram-se o homem em espírito, alma e corpo, onde o espírito tinha o poder da transcendência, ou seja, ampliar sempre novos conhecimentos, querer mais, a satisfação só seria aceita se inovações surgissem.
A alma ficou nos campos das emoções, do intelecto, das afirmações relacionadas às culturas, da criatividade humana. A alma humana é capaz de criar, de elaborar, de transformar o abstrato através da manifestação das inspirações, contrapondo-se, ou mantendo-se o irreal, o fortalecimento do abstrato, colocando na arte todas as aspirações, humanizando as formas, fazendo das artes, poesias, histórias, elementos de transição do imaginário, para poder tocar, poder sentir e poder ver. A humanização, como forma concreta daquilo que o ser humano imaginava, vagava, criava nos seus inconscientes, transformando em algo palpável, aonde pairavam todas formas anteriores de veneração, em algo agora venerado com a alma, que podia sentir através do contato e dar vazão ao espírito.
Lucrecio (98 – 55 a.C) apud Durant (1942), “A alma e o espírito desenvolvem-se com o corpo, crescem juntamente com ele, doem-se com suas dores e morrem com sua morte. Nada existe à exceção dos átomos, do espaço e das leis naturais; e a lei das leis é a da evolução e dissolução de todas as coisas”.
O que podemos observar é que, almas, espírito, estão dentro das formas da construção, daquilo que vem do interior do ser, daquilo que o homem pode materializar, mostrar, sentir e enxergar.
Aquele homem que foi gerado e concebido por homens, agora é capaz de perceber os seus valores sentimentais, ocultos, sensíveis, simplesmente transformados em obras de artes. Mostram com clareza as formas, a natureza e o poder de concepção que o homem pode ter, transformando as matérias inanimadas em expressão de arte, que são sentidas ao simples contato.
Homens que possuem em seu interior a criatividade, que é comum ao ser racional, ao ser que consegue através dos milhares de anos de evolução, terem manifestado suas vontades. É tolhido em suas criações, quando aquilo que pensam é colocado como vindos de forças superiores, de outros espíritos e de outras almas. Para Demócrito (460 – 360 ac) apud Durant (1942, p. 92), “A alma não é material” – nem toda ela morrerá.
Diríamos que é uma transferência dos conhecimentos humanos, que a partir do momento em que adquirem forma, personalização, não conseguem mais sair do imaginário humano, de acordo com a sociedade na qual está inserida.
Será que o homem é incapaz de aceitar a sua própria criatividade, tendo que colocar como coisas divinas, aquilo que lhe é nato? São coisas que a sua própria condição mental proporciona, em elevar-se a níveis de criação, que quando materializadas, expressam o próprio homem, mas que as estruturas tentam mostrar que o homem seria incapaz, a não ser quando tem uma manifestação externa.
Por que o homem, em sua sã consciência, não pode construir, pensar e racionalizar aquilo que sonha, como se os sonhos fossem de competências espirituais e não de devaneios da própria mente em descanso ou do corpo envolvido pelos seus diversos espasmos musculares?
Porque o homem tem que buscar nos mitos, as forças para tentar compreender aquilo que é natural que é reflexo do seu próprio pensar e que logicamente sofreu reflexos das sociedades?
O que podemos perceber é que, alma e espírito, são forças de criação e fonte de desejos, são momentos de liberdade e de desligamentos, de devaneios, é a materialização de suas utopias e de suas loucuras. Não são as loucuras que a sociedade tenta impor como formas da existência de espíritos como seres alados ou almas de pessoas que já se foram, de coisas que colocam espíritos e almas fora da compreensão humana, de incompreensões que são criadas para justificar o que é justificável. Justificar aquilo que é da essência do homem, sendo colocado como algo intocável e muito bem materializado pelas religiões. Essas conseguem transformar aquilo que é abstrato em concreto, fazendo com que a mente humana se resigne a subjetivar, a alienar-se, sem compromissos com o que há de verdade, limitando-se a aceitar o que se manifesta como verdadeiro.
O espírito, que na sua essência é o poder de querer, poder de elaborar, poder de pensar, é colocado pelas ideologias culturais como aquilo que representa o transcender no abstracionismo, estar vinculado com a morte. Não admite o homem como fonte de suas próprias espiritualidades, palavras nascidas nas filosofias como algo criador, gerado pelo próprio homem. E também não, por aquilo que sobrou dos homens, como restos de sua existência, de suas vidas, dando a ele como compensação, a reencarnação, a ressurreição e vidas paliativas além da vida. Coloca-se a morte como o começo de outras vidas, de vidas eternas, como se os pensamentos pudessem se materializar em outros corpos inanimados e não como a materialização de suas idéias plantadas, semeadas através de criações, do preservar a sua vida nas suas construções, nas suas obras e nas suas artes. A única forma de se ressurgir, de se preservar, é manifestando criações, os seus pensamentos nas esculturas, pintura, arquiteturas, poesias, nos seus livros e assim mantendo-se materializado para que outros possam ver a beleza que foi a sua existência. Caso contrário este homem morrerá, não restando nada além daquilo que será percebido por uma visão mais longe das construções humanas, sem se limitar a um único homem.
O espírito e alma são humanos e não como as sociedades passaram a construir, santificando aquilo que é racional, endeusando aquilo que é fruto das construções do pensamento. Usam o espírito como algo irreal, dando formas a eles, na construção de anjos e demônios, do sobrenatural, iludindo, dominando aqueles em que, na ignorância dos conhecimentos, acabam por serem levados a loucuras, tentando ver o impossível, construindo em suas mentes o que a lógica não permite. Tornam-se doentios em suas fugas, na busca do irreal, na busca intensa de vidas além daquelas que a natureza lhes deu, indo a caminhos opostos à inteligência que a evolução permite, buscando no irracional, as respostas tão necessárias para quem é humano que são respostas para a morte.
A morte que é tida como a chance de se elevar junto a Deus pai, todo poderoso. Deus criado como espírito dos espíritos, capaz de alimentar a todos, de resolver todas as mazelas humanas. De poder alimentar com verdades aqueles que vivem de mentiras. De poder dar vida além da morte, de gerar vidas, de ajudar aqueles que são subjugados pela sua força. De dar garantias eternas, para os homens que buscam a vida eterna, como se isto fosse possível. São incapazes de ver o mundo por outras óticas, de poderem buscar a igualdade humana e não as desigualdades daqueles que vivem mais distantes de Deus ou daqueles que são superiores, à medida que estão mais próximos dele, os chamados eleitos, os escolhidos. Que não questionam as suas realidades já que Deus está acima de tudo e para eles o que existe é a fé. O espiritualismo fruto da natureza humana não se discute, a subjugação da fé deixa de ser questionada.
Aquilo que cegam, que deturpam, que escravizam as mentes, que corroem a alma, que degeneram o espírito, tornando a alma inatingível, quando estes são inerentes ao homem, ao poder de criação. Da busca incessante de respostas e das necessidades humanas em alcançar estas respostas.
As intolerâncias para os que pensam diferentes, o inferno como solução para aqueles que tentam desmistificar o poder das grandes organizações que submetem a sociedade. Os fundamentalistas que entendem ser as suas experiências as mais certas, eliminando e colocando sob as estruturas da passividade os materialistas.
“Homem que tem o poder de tudo, mas é fraco diante do que pode ser verdadeiro, se subjuga na sua ignorância (NA)”.

terça-feira, 7 de setembro de 2010

O TRANSCENDER PARA ALÉM DO ATO PEDAGÓGICO

O TRANSCENDER PARA ALÉM DO ATO PEDAGÓGICO
Edilene Soraia da Silva*
Marcos Jerônimo de Araújo**
soraia323@yahoo.com.br

RESUMO
O ato pedagógico se manifesta pelas cargas disciplinares oferecidas ao educando, atendendo a determinadas demandas e necessidades impostas pelo mercado. Cabe ao educador na sua formação, a interação ao modelo e práticas existentes. Mas, a ele também cabe o posicionamento da transformação, nesse momento que o transcender ao ato pedagógico se torna necessário, porque depende da manutenção do conhecimento adquirido e elevar-se acima deste vai depender da vontade do querer ampliar seu campo de visão. Com isso a práxis adquirida deve ser somada ao interesse da mudança pessoal para a melhoria da sociedade, e mudando a forma da sociedade pensar, muda-se o mundo em que se vive. Portanto, transcender nesse caso é elevar a educação acima do cotidiano, e isso requer projetos, conhecimentos de culturas, de autores de épocas diferentes que propiciaram a educação atual.
Palavras chave: Ato pedagógico. Formação e Interação. Transcender. Práxis.

1. INTRODUÇÃO
Não se deve encarar a educação como simplesmente ato de mudanças nas condutas sociais, mas como ferramenta de propostas e inserções de novas ideias que transcendam o ato da construção do conhecimento histórico. Que devem ser margeados pela ciência e concreticidade das ações do educador. No caso específico deste tema, o educador como fonte da desconstrução de determinados modelos que cerceiam o pensar, delineados pelos anos de imposição de culturas externas que levaram ao comodismo e passivismo e não observação de modelos de produção que obrigaram sociedades colonizadas a interagir, como se as culturas fossem de suas próprias raízes. Ou mesmo sociedades colonizadoras que no seu meio mantiveram e mantêm grupos sociais afastados da plenitude do conhecimento, por precisarem de pessoas que satisfaçam suas necessidades básicas.
A educação deve estar isenta na construção do conhecimento, mas para isso o educador em sua formação deve se perceber enquanto possibilidade de mudanças, e quando no exercício de suas funções constantemente avaliar o quanto cedeu ao sistema. Essa consciência não é fácil, já que na medida em que interage com a sociedade, também se modela a novas culturas.
O aprisionamento das capacidades educadoras limita-se a determinadas necessidades que surgem na vida profissional do educador, portanto, a autocrítica é uma forma de ponderar sobre seus atos. E quanto mais livre for, melhor poderá discutir a liberdade educacional.

2. A TRANSCENDÊNCIA DO EDUCADOR SOBRE SI MESMO
Este artigo visa discutir a condição do educador diante de sua realidade e do resultado do seu trabalho. Urge na sociedade a necessidade de que o processo educativo leve os cidadãos à transformação do que está posto há séculos de dominação hegemônica, seja em esferas econômicas, políticas ou de cultos religiosos. Para tanto, o educador é elemento-chave e para tal tarefa, precisa ser transcendente de sua própria condição de dominado pelo sistema ao qual precisa combater através da educação.
Um dos piores males que o poder público vem fazendo a nós, no Brasil, historicamente, desde que a sociedade brasileira foi criada, é o de fazer muitos de nós correr o risco de, a custo de tanto descaso pela educação pública, existencialmente cansados, cair no indiferentismo fatalistamente cínico que leva ao cruzamento dos braços. “Não há o que fazer” é o discurso acomodado que não podemos aceitar... Como cobrar das crianças um mínimo de respeito às carteiras escolares, às mesas, às paredes se o Poder Público revela absoluta desconsideração à coisa pública? (FREIRE, 1996, p. 74).
O combate que ora se pretende, não gera violência, mas sim a busca incessante pelo conhecimento a fim de encontrar respostas às inquietações naturais do ser humano, respostas estas que coloquem um fim nas alienações de pensamento e de atitudes gerando até certo desconforto, mas que abre caminho para a coragem do uso das palavras com convicção.
No processo da globalização, a educação gera os mitos e foram criados em torno desta idéia, gerando a noção de que, se os países pobres seguirem os mesmo caminhos das potências capitalistas, alcançarão certamente altos padrões de vida para toda a população (BARBOSA, Revista da Educação, 2004, p.28).
A organização social estabelecida pelas culturas, seja de dominação ou de manutenção, faz com que o homem se cale diante dos poderes constituídos. Com dificuldades querem mudar, mas mudar exige esforços e desprendimentos. Mas as facilidades oferecidas pela passividade são maiores. Principalmente quando isso se reverte em benesses pessoais. O que faz com que mudanças sejam demoradas, porque a grande dificuldade está em visualizar e se libertar do que está imposto.
O homem se diferencia dos animais a partir do momento em que se começa a produzir seus meios de vida, passo este condicionado pela sua organização corporal. Ao produzir seus meios de vida, o homem produz indiretamente sua própria vida material (MARX, ESTRUTURA SOCIAL E CONHECIMENTO)
Ao professor não cabe mais a condição de reprodutor de um sistema de conhecimentos fragmentados, descontextualizados e segregadores da dominação de massa, através de metodologias que colocam os aprendizes em situação passível de serem doutrinados, adestrados ou treinados como seres incapazes de pensar por si próprios. Diante de ouvidos, olhos e mentes capazes de compreender desde o mais simples ao mais complexo, cabe ao professor elucidar os caminhos em que os seus educandos percebam sua participação neste sistema.
Se deve entender a educação como algo profundamente significativo. Pode-se dizer que a educação representa o processo vital e consciente de contínua retomada de consciência de si mesmo, para o homem continuar a aprofundar a própria personalidade, e procurar novos caminhos de autorealização e de integração criativa e responsável na sociedade em que está inserido (SCHMITZ, 1993, p. 17).
Desde os primórdios, ainda na educação pelas artes rupestres, o conhecimento se dá pela mera transmissão de fatos e idéias sem grandes preocupações com a formação do indivíduo como ser livre e autônomo. O ser humano desde que entrou para a era do conhecimento e adquiriu seu epíteto “sapiens”, pouco evoluiu, além da cultura e tecnologia, para sua transcendência cultural. Ainda é minoria o grupo de pessoas com tal privilégio ou sentença, conforme seu tempo e sociedade.
Durkheim (1974, p. 93) procura estabelecer assim um método para um pensamento objetivo, racional. Diga-se, mudar ou perceber-se enquanto capaz de alterar modelos. Quando ele discute fato social, diz que,
É um fato social toda a maneira de agir, fixa ou não, capaz de exercer sobre o indivíduo uma coerção exterior, ou ainda; que é geral no conjunto de uma dada sociedade tendo, ao mesmo tempo, uma existência própria, independente de suas manifestações sociais.
Se não temos plena consciência nem mesmo dos motivos de nossas ações cotidianas, como entendermos nossos propósitos, como conseguir discernir as causas de nossas conformidades.
A idéia que Durkheim tem em mente é que o indivíduo participa de modo muito pouco significativo na produção da sociedade, sua contribuição é ínfima.
Um educador com visão geral do mundo só se alcança diante de muita leitura, reflexão e força de vontade e após todo esse esforço, conforme o sistema em que esteja inserido em seu contexto poderá ser considerado um sábio ou uma ameaça. Mas isso não pode levar ao medo e à sucumbência, pois o poder nas mãos de um educador se dá pela força das palavras e não por arranjos políticos ou econômicos. O poder de um educador está no que é capaz de ensinar muito além dos conteúdos curriculares e dos próprios Temas Transversais. São os ensinamentos para a vida livre, não apenas para procurar um emprego e ajustar-se ao sistema, mas para tomar decisões sobre sua vida com a tranqüilidade de saber escolher diante das adversidades pela capacidade de compreender o mundo ao seu redor.
Há currículos e práticas pedagógicas pobres porque são destinados à população pobre, ou seja, há "uma escola pobre para o aluno pobre", como diz Penin (1989, p. 157), numa lógica distorcida que faz da escola não uma instância mediadora e sim reprodutora, condenando os alunos a permanecer no patamar em que já estão. (VEIGA, 1995. p.118)
De certo modo, o educador tem a capacidade de manipular o próximo, seu educando, conforme sua prática pedagógica lhe permite. Essa manipulação se torna adestradora enquanto o próprio educador ainda esteja nesta mesma condição de adestrado, porém, ao conseguir transcender sobre isso, percebe em si a obrigatoriedade de gerar um movimento transgressor do sistema em prol da fala livre e consciente de suas consequências.
É preciso levar o conhecimento sobre a educação velada dos sistemas políticos que nos induzem a eleger sempre os mesmos que não trabalham pelo povo, mas sim em causa própria, os sistemas econômicos que geram competitividade desleal pelo consumismo fútil que destrói o planeta dia-a-dia, colocando nossa própria sobrevivência em xeque, o sistema religioso que impõe a fé à custa do sofrimento por um Deus pregado pelos homens como justo em seus castigos, sistemas culturais de subjugação do homem sobre si mesmo em rituais, folclores, tradições que vão contra a natureza e contra os princípios básicos de respeito a qualquer forma de vida.
2.1 A TRANSCENDÊNCIA DO EDUCADOR SOBRE SEUS EDUCANDOS
Muito mais recente do que a educação através da arte rupestre está a educação medieval, na qual algumas pessoas eram marginalizadas, ao ponto até mesmo do abandono total para a não sobrevivência, por conta de estigmas conforme suas características. O educador que consegue transcender a si próprio consegue respeitar as diferenças diante de seus educandos, sejam estes portadoras de necessidades especiais, ou diversos de sua própria etnia, sexualidade, condição econômica ou quaisquer outras formas de manifestações de cultura.
A consciência pode crer que seja algo diferente da consciência da prática existente, que representa realmente qualquer coisa sem representar algo de real[1]
Neste caso, a educação vai realmente muito além do ato pedagógico. O educador a partir do Renascentismo e da própria Era Científica, necessitou rever seus conceitos diante de uma visão de ser humano agora capaz dentro de suas especificidades. Cai a partir daí o papel do antropocentrismo que assolava a educação no que podemos reformular como um “profecentrismo” em que o professor seria o único detentor do saber, o único capaz de ditar normas dentro de sua classe de regência magna.
Decisivo torna-se o reconhecimento de que manejo e produção de conhecimento são os instrumentos primordiais da cidadania e da economia, levando a rever, radicalmente, a proposta educacional vigente, por ser esta absurdamente arcaica, inclusive na universidade. Como regra, pratica-se a didática marcada pelo mero ensino e pela mera aprendizagem. De um lado, aparece um pretenso sujeito, chamado professor, que apenas ensina, no sentido surrado de copiador de cópias, já que definido como ministrador de aulas, sem qualquer compromisso construtivo... De outro, aparece um típico objeto de aprendizagem, o aluno, cuja função é ser cópia da cópia. (DEMO, l994, p. 13-14)
O preconceito que assombra ainda a contemporaneidade atrasa todo o processo educativo diante da exclusão que gera aos que refletem quaisquer grupos sociais diversos do que a sociedade considera como espelho da moral e do belo. Este entrave não sairá por encantamento de repente enquanto o educador não desprover-se primeiramente de si próprio, do preconceito.
É no trabalho do educador que se encontra a mudança, afinal nenhuma criança nasce com preconceitos nem mesmo com quaisquer conceitos, ele os aprende na sociedade com a qual interage, na qual foi inserida, só isso basta para confirmar a tese de que o preconceito é apenas mais um dos desmandos da própria humanidade, da subjugação do homem sobre o homem a partir da aquisição da racionalidade com a qual vem o desejo de bem estar e consequentemente de apropriação material. A própria legislação, felizmente já alterada embora ainda com muito a se rever, por vezes trazia a exclusão como fato normal.
Não serão matriculados e, portanto, não entrarão no sorteio: a) as crianças com idade inferior a 6 anos incompletos [...]; c) os que sofrem de moléstia contagiosa e repugnante [...]; e) os imbecis e os que por defeito orgâni­co forem incapazes de receber educação (Decreto-lei 1.216 de 1904 do Estado de São Paulo), (Jannuzzi apud Gaio; Meneghetti, 2005, p. 19).
Toda a guerra e luta em torno da mudança dos regimes políticos seriam desnecessárias se os homens conseguissem manter-se desprovidos dos preconceitos e sentimentos de posse. A busca pelo socialismo se torna fugaz diante de um sistema capitalista avassalador que atende aos instintos mais sórdidos do ser humano, que são os instintos de ganância. Tornamo-nos hipócritas até ao levantarmos as bandeiras do socialismo quando na verdade competimos no mercado de trabalho com toda nossa vontade por um salário que possa nos oferecer conforto, luxos e modismos. Afinal, quem não gosta de viver bem?
No discurso temos todas as soluções, a prática é o problema. Portanto a práxis pedagógica fica prejudicada diante de discursos demagógicos que são desmascarados pela futilidade do pensamento e do discernimento diante do concreto. Isso não significa que o educador deva abster-se de usufruir dos louros de seu labor, mas levar à compreensão de que a mudança de postura diante do consumismo desenfreado é nossa nova condição diante de um planeta ameaçado. Levar a compreensão de que verdades absolutas são engodo e que a única verdade que existe é a morte.
2.2 ATRANSCENDÊNCIA NA FORMAÇÃO DO EDUCADOR
Na contemporaneidade o que se vê é uma educação a partir de uma nova formação dos educadores. Até então os cursos ofereciam disciplinas como Filosofia e Sociologia a fim de que o homem pudesse compreender-se e ao “mundo” ao seu redor de modo sistemático, porém, descontextualizado do “outro”. Surge a necessidade de promover a inclusão desta margem da sociedade de pessoas discriminadas pelo processo histórico-cultural-educativo, diante dos novos conceitos de integração para a normalização do ser.
Conforme Pinto (1986, p. 25), “A universidade representa o instrumento mais eficiente para assegurar o comando ideológico da classe dirigente ao lado de outros, subsidiários, como a imprensa, o púlpito, etc, porque ela incumbe a produção dos próprios esquemas intelectuais de dominação”.
A responsabilidade da educação é determinante na construção das liberdades, para Pinto (1986, p. 29),
A universidade absorve e amortece o surto da consciência popular, representado pelo elemento estudantil descomprometido com os poderosos. Transformando a todos como produtos genéricos que vão atuar em prol do crescimento das economias na maioria das vezes de empresas estrangeiras.
Normalizar, por sua vez, não significa transformar os indivíduos diferentes, mas sim transformar as pessoas e os espaços a fim de oferecer-lhes condições de participar, integrar-se respeitando suas potencialidades e individualidades. Isso se dá pelas políticas públicas que se adequam à essa clientela que está ainda marginalizada e que cabe à escola, resgatar junto às famílias e demais seguimentos da comunidade escolar.
Nos cursos regulares das licenciaturas em nível superior ou mesmo nos cursos de magistério, em nível médio, os currículos já vão sendo adequados e a própria grade curricular traz disciplinas diversificadas para preparar o educador através do estudo sócio-histórico-cultural, por meio do conhecimento e da reflexão diante das injustiças excludentes das pessoas marginalizadas. O mesmo ocorre nos cursos de Educação à Distância (EaD), sendo que os materiais produzidos neste caso, bem como a carga horária destinada aos estudos, podem furtar ao processo educativo, a qualidade no resultado do profissional que mesmo participante e disciplinado, possa perder conteúdos significativos por falta de tempo e espaço.
Este seguimento da educação é foco de diversos estudos pela disseminação rápida diante da possibilidade de diminuição dos custos e no que é mais fortalecida sua defesa, levar possibilidade de estudos às pessoas que vivem em locais muito isolados, onde a infra-estrutura e a falta de vontade política ainda não permitem a construção de escolas regulares.
A formação do educador, portanto, será decisiva para seu resultado final como profissional da educação, o que leva a concordar com Makarenko quando escreveu que "nas nossas escolas, os alunos comportam-se bem nas aulas de um professor e mal nas aulas de outro. E isso não é de modo algum porque um deles seja talentoso e o outro não, mas simplesmente porque um é mestre e outro não” (apud CAPRILES, 1989, p. 156).
2.3 A TRANSCENDÊNCIA DO EDUCADOR NO PROCESSO AVALIATIVO
Avaliar antes de tudo é perceber-se como detentor do poder de modificar o resultado na vida dos educandos. Além do ato de medir sua capacidade através dos instrumentos avaliativos, o avaliador, neste caso, o professor, precisa novamente despir-se dos preconceitos por ele assimilados no percurso de sua própria vivência e formação, tomando consciência da sua influência direta na reação do educando diante do processo avaliativo. Para isso, sua prática de “avaliação deverá acompanhar cada etapa da aprendizagem e, portanto, deverá ser contínua, gradual, constante, cumulativa, coerente e cooperativa” (MARTINS, 1989, p. 57).
Deste modo, o educador tem por obrigação buscar conhecer o contexto dos educandos antes de emitir pareceres avaliativos ou exprimir opiniões sobre os envolvidos sem considerar suas potencialidades e limitações, sua história e condição enquanto ser participante de um processo contínuo de construção de saberes. Isso não implica em subestimação das suas capacidades nem tampouco em sucumbência ao sistema educacional que se resume a índices estatísticos com interesse em financiamentos do Banco Mundial. Mas legar aos seus educandos o direito de aprendizagem pela busca do conhecimento por ato próprio, poi segundo Lembo,
Ao tratar de aprendizagem, ninguém perguntará se o professor foi bonzinho ou não, se benigno ou rigoroso. A pergunta será: o que você sabe fazer e como trabalhará? Se alguém sabe pouco e trabalha mal, tem remotas possibilidades de realização pessoal e desempenho profissional. Promover um aluno sem que ele tenha nível suficiente de aprendizagem, não é ajudá-lo, mas prejudicá-lo.
No ato de avaliar, o professor deve voltar a ser exigente e para isso deve contar com o apoio da família que afastada da escola, não compreende o prejuízo que esse descaso de ambos os lados, causam à formação dos educandos. Falha a escola em não cobrar a presença da família, falha a família em não buscar participar para conhecer os problemas da escola. Não se pode concordar com um sistema que impõe normas que não condizem com a realidade da práxis educativa. Cabe ao educador unir forças para combater pela discussão as leis que atrapalham o processo ensino-aprendizagem. Leis estão aí para serem cumpridas e discutidas, para serem reformuladas conforme a sociedade exija pela mudança de comportamento e de modo de vida. Se assim não o fosse, deveríamos estar até os dias de hoje, regidos pelo Código de Hamurabi.

3. CONSIDERAÇÕES FINAIS
A necessidade de se propiciar mudanças na educação se insere no ato do mundo acadêmico, a partir de sua formação. Propondo a interação de todos os modelos culturais pelos quais a educação passou, ou se modelou. Desenvolver trabalhos com pesquisas trazem como propostas, melhorias e acréscimos nas informações amadurecidas através da práxis educacional.
O contidiano educacional deve oferecer alternativas que sustentem novos modelos e a transcendência daquilo que está imposto. Os poderes envolvidos na construção dos programas educacionais exerceram e exercem sobre a sociedade a acomodação e o ajustamento, e mesmo as qualificações trazem propostas para atendimento das necessidades básicas da sociedade. Ficando para o profissional da educação a reversão e transposição destas relações. Algo não impossível, mas de extrema necessidade e seriedade para que ocorram mudanças.
Com base neste pensamento, a educação vai mal em função de que diante do arrocho salarial, das cobranças pelo atendimento que a família não dá por parte da escola, das leis e normativas educacionais que impõem aumento de trabalho e de carga horária não remunerada para cumprir calendário letivo e projetos extracurriculares em separado, tirando do professor a vontade de continuar, o tempo para si próprio, na política de que agora nada mais pode, não pode reprovar, não pode reprimir, não pode suspender, não pode expulsar, não pode ter atividades de integração em dias letivos, não pode cumprir suas tarefas no sossego do seu lar, etc., o professor vê-se encurralado e não pode também trabalhar com satisfação.
Toda essa problemática interfere no processo de construção do cidadão, levando ao faz-de-conta da educação apenas para cumprir com os protocolos, sem importar que o professor que tem que ser tão justo e coerente com seus educandos, não possa ser tratado com dignidade diante do caos que se tornou a profissão de professor.

REFERÊNCIAS
CAPRILES, René. Makarenko: o nascimento da pedagogia socialista. Série Pensamento e Ação no Magistério. São Paulo: Scipione, 1989.
DEMO, Pedro. Pesquisa e construção de conhecimento: metodologia científica no caminho de Habermas. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1997.
DUKHEIM, Émile. As regras do método sociológico. Trad. Maria Isaura Pereira de Queiróz. São Paulo: Cia Editora Nacional, 1974.
FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia – saberes necessários à prática educativa. 25 ed. São Paulo: Paz e Terra, 1996.
GAIO, Roberta, MENEGHETTI, Rosa G. Krob. Caminhos pedagógicos da Educação Especial. 3. ed. RJ: Petrópolis: Vozes, 2004.
IANNI, O. (org). Marx: sociologia. São Paulo: Ática, 1992.
LEMBO, John M. Por que falham os professores? Traduzido por Maria Pia Frito de Macedo Charlier e René François Joseph Carlier. São Paulo: EPU, 1975.
MARTINS, Pura Lucia Oliver. Didática teórica didática prática – para além do confronto. 1 ed. São Paulo; Loyola, 1989.
PINTO, Álvaro Vieira. A Questão da Universidade – 2 ed. São Paulo: Cortez, 1986.
REVISTA DA EDUCAÇÃO. Planejamento do Cotidiano da Escola. No 132. Ano 33/07 a 09/ 2004. p.128.
SCHMITZ, Egídio Francisco. Fundamentos da didática. 7 ed. São Leopoldo: UNISINOS, 1993.
VEIGA, Ilma Passos Alencastro (org). Projeto político-pedagógico da escola – uma construção possível.Campinas: Papirus, 1995.

A CASCA DO OVO - "A história de Galileu - um jovem em busca de respostas"

Prefácio

A idéia central do tema é perceber-se como um simples mortal. Indagando as várias naturezas humanas, e todos os pilares da sua formação cultural.


A CASCA DO OVO

Capítulo um

Ao nascer Galileu, não tinha uma visão real de seu mundo, mas percebeu que o seu mundo não era diferente dos outros que já o habitavam. Porque seus antepassados viviam sem nunca questionarem o que já haviam recebido por hereditariedade.
Cresceu nesse mundo tentando entender o que lhe falavam.
Quando perguntava sobre a existência de outros mundos, lhe diziam. Sim, existe um mundo melhor. Onde você passará sua eternidade no meio daqueles que são bons. No meio daqueles que mereceram um mundo melhor do que este em que vivemos. Lá você encontrará a paz, terá vida além da morte, estará junto com o nosso deus.
Outros diziam, vivemos em um mundo distribuído por cordas, por dimensões inimagináveis, por mundos paralelos, onde a existência corresponde em alguns graus com o nosso mundo.
Outros diziam lá você gozará pela eternidade de virgens, rios de leite e terá direito a todas as benesses que os bons possuem, ou ainda mais de acordo com os teus sofrimentos poderá se tornar um mártir e mais perto de deus estará.
Outros diziam você faz parte da natureza. E como natureza a ela voltará compondo e recompondo as energias já existentes.
Outros comentavam que seus diversos deuses entre malignos e benignos, existiam aqueles de natureza animal, outros de natureza vegetal, outros de natureza cosmológicas. Mas, sempre naqueles em que acreditavam eram os verdadeiros e melhores.

Galileu quando criança era terrível. Tinha um comportamento completamente irascível, difícil de ser entendido, teimoso, de temperamento para sua idade violenta, talvez fruto do que tinha dentro das informações que recebia ou via. Brigas constantes dos pais, parentes que se odiavam – xingamentos de todas as espécies. Não aprendeu a amar nem a falar palavras carinhosas. Pelo menos nesse momento de sua vida.

Algumas lembranças chegam até sua memória, como aquela que aos seis anos criou-lhe talvez o maior trauma – vendo sua mãe chorar um dia à tarde, perguntou o que tinha acontecido, e ela respondeu que a aliança do meu pai estava pendurada no prego da cozinha, atitude que correspondia a ele ter ido embora. Galileu saiu correndo até a parada do ônibus para ver se ainda o encontrava e - daí se passou vários anos até que ocorressem contatos.

Enquanto isso lembra Galileu, experiências terríveis, como ser enjeitado, ninguém o queria, sua mãe tentava a todo custo dar a sua guarda a alguém, mas, sabem quem iria querer um menino de quase sete anos, e ainda com o comportamento que tinha? Além-claro de possuir mais duas irmãs e um irmão mais jovens e com possibilidades bem maiores de adoção. Coisas que para alguns afortunados até acontece, mas, não foi o caso inicial de Galileu e nem de seus irmãos. Vivia de lembranças, enquanto aguardava alguém que lhe quisesse, como aquela vez em que brincando de carrinho de lomba, foi quase castrado quando as rodas de rolimã se encheram de terra e o carrinho deu uma parada brusca, com ele passando sobre o grande parafuso que prendia as rodas dianteiras, ou aquela que empurrava uma bicicletinha na qual sua irmã de cinco anos ia pilotando e veio uma lambreta passando praticamente por cima deles, fazendo com que fossem arremessados para uma valeta. Ou ainda, quando sua irmã pequena de um ano e meio gritava de fome e sem saber o que fazer pegava o leite em pó escondido em cima de um armário, e enfiava na boca dela para parar de chorar. Ou um dia quando chovia muito, lembrando que alguém tinha lhe dito que gagueira poderia ser curada com um susto, aproveitando que seu irmão de quatro anos estava na janela, deu-lhe um enorme empurrão, fazendo com que ele caísse dentro de uma lata de banha, cheio de água da chuva, situação de certa forma quase mortal, mas, benéfica ao final porque deu tudo certo, inclusive a cura da gagueira. Ou quando tirava carrapatos grudados nas costas de seu irmão – que juntamente com ele brincavam em um lixão próximo da casa. Ou quando caiu um tombo violento de um barranco no qual foi buscar peixinhos para servirem de alvos para sua artilharia, dos sapos que com o machado abria ao meio para ver se sobreviviam depois, ou dava aos sapos brasas do fogão enganando-os e verem se queimaram todo, tentando cuspir as brasas, mas estas já tinham se grudado em sua língua. Outra vez, daquelas que corria por sobre a casa ou subia no alto das árvores, e caia de cara no chão, quebrando praticamente toda a boca. Quando soltava pipas com seu irmão e as colocava em alturas, onde perdia o controle dela – e ela escapava seguindo novos rumos. E desse mesmo irmão lembrava, quando ele levava surras tremendas, na qual Galileu tentava impedir o irmão de ficar todo quebrado, procurando segurar as mãos de sua mãe, que batia violentamente com um cabo de vassoura. Das tantas vezes que ficava a sós com seus irmãos que choravam de fome ou de gripes, ranhentos e sujos.

Capítulo Dois

Depois de alguns episódios em que sua mãe tentava doá-lo, no seminário dos capuchinhos não queriam pobres, os tios saíram todos de perto para não se incomodar, quando de repente foi morar com um tio, lembra ele – transava com sua tia o tempo todo, dividido só por uma cortina. Galileu agora com sete anos, não conseguia dormir. Depois de vários dias dessas atitudes que não gostava, fugiu. Saiu meio sem rumo, sem saber para onde ir. Depois decidiu ir à casa da avó materna. Sua mãe se encontrava hospitalizada e sem poder ter contatos com os filhos. Chegando à casa da avó, tentou-se explicar o motivo da fuga, mas sua avó mais que depressa disse – aqui não pode ficar já estamos deixando a tua irmã mais velha ficar. E dois é impossível – diante disso mandou que uns dos seus filhos me levassem para casa, começaram alguns períodos difíceis da minha vida, passava os dias fechado em um quarto, sentia minha carne apodrecendo, saía do quarto e permitiam que ficasse algumas vezes na parte posterior de uma escada externa que dava para um muro muito alto, onde passava as horas matando formigas e lagartixas. Depois, normalmente escolhia toneladas de arroz e feijão, após voltava para o quarto e de lá não podia sair sem autorização, somente olhando o movimento das ruas por traz das grades da janela. Passaram-se meses, até que surgiu uma avó paterna e me quis. Disseram que ela iria me tratar muito mal, que ela não tinha o que comer – só polenta rala com alho. Mas, não tinha alternativa, fui morar com ela, e lá naquele porão úmido, de talvez dois metros por um e meio, vivi uns cinco anos, passando necessidades alimentares, mas, fui colocado na escola, e o fato dela cozinhar o que pedíamos para a Legião da Boa Vontade, o que buscávamos nos postos de atendimentos da prefeitura. Dos cobertores que ganhávamos – das roupas e pijamas de pelúcias que gostava demais, porque me sentia aquecido e protegido – como se alguém me oferecesse carinho. Coisa que não lembro de ter ganho, enquanto criança.
Também guardo a lembrança das várias vezes que saía junto com outros meninos pedindo esmolas com pequenas sacolas de pano, de casa em casa, das quais recebíamos alimentos e algumas vezes dinheiro – que no meu entender não deveriam ir para a Legião, mas sim trocados por comidas nos mercadinhos e os quais também serviriam para atender outros que passavam fome. Que muitas vezes nem para pedir, tinham condições. Pessoas que eram atendidas em baixo de uma grande ponte, que mal tinham forças para levantarem os braços para receberem a sopa que lhes era entregue somente nas quartas-feiras, muitas vezes em canecos feitos com garrafas de vidro. Pensava como viviam os outros dias da semana?

Capítulo Três

Cresceu nesse mundo, fornecido por relações culturais estabelecidas e aceitas. A sociedade não consegue avaliar seu grau de liberdade ou escravidão, exatamente por ter um sistema coercitivo.

O que Galileu mais queria, era poder participar da sociedade. Na sua visão ser um trabalhador com carteira assinada, com seguranças, para que em um dia pudesse gozar dos benefícios dessa segurança, que entendia ele – um dia iria conquistar.

Fazia todas as práticas de alguém que possuía treze anos. Claro para sua época, trabalhava, estudava, cursava técnico em rádio e Tv aos sábados, procurava ir à igreja católica, algumas práticas em centros espíritas e também tinha um amigo que era luterano e juntamente com ele ia aos cultos. Tinha as crenças de sua idade, que os pecados existiam, que também podia se redimir de alguns, que poderia conquistar espaço no céu. Que seria recompensado pelas suas atitudes boas, ou negligenciado pelas más.













Sociedade em Construção


Existem momentos da vida em que nos sentimos fracos diante da ignorância que nos rodeia.
Como consequência para proporcionarmos um mundo melhor - temos que revisar conceitos, mesmo muitas vezes estando sós.
Inicia-se aqui o repensar da sociedade.

A Sociedade como modelo de reprodução.

Quando passaremos a produção?